Onde começam as inovações
Logo que, se uma inovação nos mostra alguma
coisa de antigo, ficamos tranquilos.
Friedrich Nietzsche
Cabe a esta etapa do trabalho revisitar questões suscitadas no interior de debates sobre os processos, métodos e perspectivas relacionados com a terceira e quarta revolução industrial.
A rápida transformação da realidade mundial seguida da iminência de substituições de dinâmicas sociais, econômicas, culturais, políticas têm causado furor e inúmeras divergências entre os observadores, amadores, especialistas e outros grupos interessados no tema das inovações anunciados em alguns livros e eventos espalhados pelo mundo.
Não é possível pormenorizar todos os fundamentos que assistem as questões assentadas no terreno das inovações, mas podemos nos pautar no principio irrevogável de que todas as revoluções produzem repercussões sem fim em todos os setores, obviamente guardadas as proporções e particularidades inerentes ao âmbito e exercício de cada caso específico.
Importante destacar que este movimento de questionar visa o entendimento das ideias e fundamentos impressos nos adventos, quer seja, nem de longe vislumbro dissecação histórica, econômica e social destes adventos. Até porque esta proposta não se ajusta aos limites deste trabalho, por razões de inviabilidade, portanto não cabendo ao bojo e proposta do estudo.
Com bastante empenho em estudos mais atuais e a partir de estudos sistemáticos, constatei que vários textos, inclusive, de alguns pensadores famosos, tentam imprimir o marco zero nas atuais transformações que o mundo atravessa. Certamente não vou dissecar histórica e antropologicamente, mas minhas noções não deixam dúvida de que é absolutamente incongruente falar de inicio dos fenômenos de inovação dado em princípio o próprio significado simbólico e efetivo do termo “transformação”. Para dizer em outras palavras, estamos sendo transformados e transformando desde o início dos tempos.
Tanto que fixar datas ou períodos para determinar o surgimento desta e daquela descoberta, ideia, ação, iniciativa, mudança. Configura em risco colocarmos algum imperativo neste sentido se tivermos em conta a vastidão da história humana. E mesmo que por ventura possamos conseguir um marco zero teremos que especular questões relacionadas com nossa natureza conforme vimos em outras partes do trabalho. Além de que se fizermos isto, entraremos em uma sequência evolutiva que tem mais possibilidade de confundir do que de esclarecer. Explicitado de outra maneira, talvez seja necessário compreender o homem em si mesmo antes de discutir seus feitos. Uma menção que ajuda a ilustrar as relações temporais, objetivas e subjetivas entre homem e obra é o caso do automóvel. Estudos respeitáveis asseguram que a “ideia” original, mais especificamente, a substância criativa que levou à invenção e construção do automóvel está em Leonardo da Vinci. Tanto que existem várias imagens em livros e na internet que atestam e asseguram que Da Vinci de fato já tinha criado um protótipo do automóvel. Outro exemplo é sobre a criação e implementação da linha de montagem. Por todo curso da história postularam que Henry Ford era o responsável pela inovação nos meios de produção, enquanto outros especialistas garantem que na verdade o nascedouro da linha de montagem ocorreu numa fábrica de alfinetes.
Nesta perspectiva, sequer podemos dizer com convicção que os grandes nomes da revolução industrial foi Taylor e Henry Ford, tendo em exame que aqueles que os antecederam já estavam não apenas fecundando o germe como estruturando objetivamente as inovações que futuramente receberiam tratamento conforme os recursos da época. Taylor recebe o título do primeiro pai da administração cientifica e Ford é festejado por ser o pai da linha de montagem móvel que permitiu a produção em massa e apresentou ao mundo um dos maiores exemplos da administração eficiente individual, mas eles pegaram a tocha e carregam o mérito de levá-la ao ponto indicado, entretanto, não foram eles que acenderam o fogo. Com isto não quero insinuar que Henry Ford não tenha aperfeiçoado de forma brilhante as invenções-matrizes de seus antecessores. Há, inclusive, uma frase magistral de Carl Gustav Jung que cito em paráfrase: “eu cheguei até aqui, espero que meus sucessores possam desenvolver aquilo que não tive tempo”.
Seja como for, a despeito das sequências inventivas, na primeira revolução um conjunto de forças reunidas no passado, no presente e no ventre do porvir levam à queda do método artesanal e da manufatura. Sem estas três forças nada seria possível em termos de inovação. Inovar não é uma escolha, mas quase uma inexorabilidade.
A revolução industrial aconteceu pelo conflito entre a insatisfação com a realidade vigente - que não cumpria seu papel de suprir as necessidades do homem - e o enorme interesse do homem de desenvolver sua própria natureza e o espaço em que ocupava - que tem a função de satisfazer esta natureza.
Por isto, a atmosfera de todas as revoluções é nutrida por disposições e inclinações naturais que se articulam no geográfico impulsionando um bloco de inovações que respondam pelas necessidades do homem. É porque faz parte de um força que quer agir sobre outra grande força que faz das revoluções o braço forte das mais importantes inovações. São potências criadas no interior do ser , tempo e espaço dispostas a alterar-mobilizar tudo que se apresenta estático: grupos sociais, sistemas vigentes e toda estrutura universal. Disto emerge o que tratamos em várias passagens: a mudança de paradigma que corresponde substituir o que não atende mais aos propósitos mais profundos por outro que quiçá possa atender. Foi o caso do rural para o urbano, do método artesanal e da manufatura para o sistema fabrile pela maquino fatura, do agrícola para o industrial, do artesão para o proletariado, clero-nobreza-povo pela burguesia e assim por diante. Percebam que é um deixar para trás, mas trazendo em si os vestígios do que está sendo deixado. Todas as experiências humanas sejam objetais, subjetivas, abstratas, concretas são adequadas dentro de um tecido que nunca se apaga ou se esgota: estende-se a cada avanço e inovação.
Muito foi escrito, estudado, dissecado, discorrido acerca das três revoluções - matriz de muitas inovações -. O motivo destas retomadas é justamente o que apresentei nos parágrafos anteriores: cada revolução carrega em si indícios que nos ajudam a entender para onde estamos indo em termos de desenvolvimento. Deste modo, por questões de coerência, o passado, o presente e o futuro precisam estar sempre alinhados nas mesas de debates, nas teses, dissertações e nas salas de aula. Mas retomo novamente para a alegação de que este trabalho não quer se demorar muito em tratados específicos, sejam historicistas, antropológicos ou qualquer outro. Avalio que se o fizesse poderia reverberar sobre o leitor como presunção, tendo em conta que não sou especialista em nenhuma destas áreas. Sou, reitero, um empresário interessado nas inovações modernas e noutras que têm sido anunciadas por especialistas do mundo inteiro, sobretudo por futurólogos que conseguiram em suas obras concatenar dados, tendências e análises detalhadas das infraestruturas mundiais e, com isto, perceber e comunicar evidências que revelam a chegada de uma nova ordem mundial. Inclusive consultei estudiosos que vão além de especulações comumente encontradas nas falácias de curiosos e imprimem rigor dialético distanciando-se dos que estão interessados em apenas usar pseudo inovações para se auto promoverem por meio de propósitos escusos.
Como perceberão no curso da leitura, transito em várias esferas abrindo mão de detalhamentos técnicos e privilegiando minhas impressões – que é realmente o que posso oferecer de mais sólido e honesto -.
Entre esta e aquela menção cito adventos, passagens, inovações, fenômenos que visam ilustrar diametralmente o momento presente e os porvires que têm sido sistematicamente anunciados em diversas fontes e veículos sem me limitar a esta ou aquela linha de estudo. Até porque eu prefiro o olhar prismático que se detém nos processos e enfoques pluridisciplinares que se revelam na reinterpretação constante do presente e do passado que consequentemente dar-nos-á uma visão mais clara do que o futuro será. Também porque verifico que aplicar rigidez e inflexibilidade na escolha de determinado enfoque produz autoritária dissonância investigativa que não representa meu apreço. Há que se considerar que minhas intervenções são de natureza multifocal, portanto, inclino-me a convergir diversas problemáticas de domínio público e individual que provocam interesse em distintas áreas de estudo. Quiçá seja esta uma contribuição relativamente louvável se considerarmos que o número de trabalhos científicos realizados sobre o assunto é inexpressivo.
A esta altura quando o termo natureza surgiu muitas vezes para trazer à baila o imperativo de que nossas forças naturais representam, quero esclarecer que não saio em defesa das teses evolucionistas ou deterministas, embora admita que muitas ações humanas só podem ser justificadas tomando como base sua origem-evolução. Não podemos negar que os traços inerentes não se dissolvem ou se encerraram nesta ou naquela época. Com exceção das extinções definitivas, que são raras, a natureza ou inteligência impressa em todas as coisas e seres não se fecham e ou se encerram no tempo.
Apesar da velocidade com que ocorrem as invenções e provocam o avanço e aprimoramento dos métodos, resguardamos informações que servirão aos novos feitos.
O bom datilógrafo será um bom digitador. Há no teclado o mesmo princípio que havia na máquina de escrever.
Objetos são frutos da inteligência, portanto se movem na velocidade do tempo-espaço e possuem fluxo estendido para o futuro que assegura-lhes a duração.
No horizonte das acelerações, no olho do ciclone das velocidades a esfera mental move-se sequencial e simultaneamente provando que a realidade mercantil não é um apêndice além do homem, mas parte dele. No aristotelismo fala-se da realização plena e completa de uma tendência, potencialidade ou finalidade natural, com a conclusão de um processo transformativo até então em curso em qualquer um dos seres animados e inanimados do universo. A isto damos o nome de 'enteléquia'.
Por outro lado, salvo alguns elementos civilizatórios e culturais, pode-se dizer que o homem inventa coisas, mas não reinventa a si mesmo e a natureza, pois que códigos inerentes às estruturas originais são conservados, a despeito das inúmeras transformações. Neste sentido, não há como ponderar em que medida as inovações intervêm alterando ou preservando as estruturas originais do ser e do espaço. Por enquanto, incontáveis estudos admitem a existência de leis irrefutáveis que não podem ser anarquizadas. Indubitável que tempo, espaço, invenções, ações participam de um fluxo que está posto desde o princípio e que é reforçado por experiências subjetivo-objetivas, concreto-teóricas. Basta-nos retroceder na alvorada dos tempos para capturar que o papel da natureza em cada período da história com seus respectivos contextos social, político, econômico, cultural, científico e filosófico permite que os níveis de evolução estabeleçam várias formas de conversações e complementaridades sem esquemas de exclusão. Integração talvez seja o que chega mais perto de descrever os inúmeros processos dos quais fazemos parte. E isto se estende ao desenvolvimento social, político e econômico que dão origem ao tecnológico e industrial. As mudanças ocorridas em vários processos da história humana prova-nos que uns fios do passado se deslocam lenta-velozmente para juntar-se a outros fios que emergem no presente e no futuro como se aspirasse compor um tecido uniforme. Nenhuma contribuição é desimportante por mais que pareça insignificante na época que foi apresentada. Indivíduos deixam suas pistas na história, por mais sutis e imperceptíveis que pareçam àqueles que não asseguram sua atenção nos feitos silenciosos das invenções simples ocultadas nas grandes invenções.
Alguns observadores padecem na tentativa de encaixar uma inovação, invenção, momento histórico em padrões divergentes, atribuir exclusividade autoral nas invenções, entretanto basta operar análises cuidadosas até perceber que em todas as inovações e produções humanas existem as assinaturas secretas, datas secretas, expressões da natureza e de atavismos consistentes da inclinação civilizatória voltada ao desejo ancestral de melhorar as condições de vida. O homem sempre quis viver bem a todo custo com sua condição. Religiões, guerras e outras medidas estão no fundo centradas na vontade persistente de colocar-se numa posição de conforto em relação a sua complexa existência. Se primariamente desejamos a satisfação puramente física e social, secundariamente almejamos o desenvolvimento da nossa consciência elementar e da nossa inteligência criativa. Este fenômeno ocorreu no salto do homo Faber para o Sapiens e depois deste último para o sapiens sapiens e acontecerá até que alcancemos dimensões evolutivas que no momento não podem ser previstas ou descritas. A cada dilatação da inteligência humana ampliamos nossas necessidades e nosso campo de interesses, por isto a ciência e as revoluções existem para acompanhar tais dilatações que passam exigir instauração de valores e práticas mais elevadas. Desde que o homem descobriu que podia sonhar e que os sonhos não são estáticos, mas móveis e contínuos, uma inquietação começou a pulsar no coração do mundo inteiro. São exatamente estas pulsações que exigem a dinamização de todas as áreas e pessoas nelas envolvidas. Disto deduzimos o óbvio: dinâmicas forçam iniciativas – onde inovações são forjadas -.
Atente-se, caro leitor, ao meu esforço para estabelecer uma espécie de sequência didática que aponte raízes-matrizes que consigam provar que cada advento existe em algum lugar da inteligência natural como uma grande potência embrionária que aguarda estruturas viáveis que permitam sua irrupção. Caímos novamente nos pressupostos imbricados nas conversações sobre perspectivas que protegem a ideia de etapas e períodos que se sobrepõem. Contrário a isto, penso que as inovações embora não obedeçam padrões únicos e estáticos não são fragmentadas, porquanto atendem uma ordem de acontecimentos que reunidos explicam a pós-modernidade que figura como somatório dos principais eventos e fenômenos passados-contemporâneos e das tendências que os colocam numa mesma direção.
Alguém há de se perguntar sobre a forma que nações menos favorecidas vão receber as inovações. Posso afirmar que tudo que defendi até aqui se aplica a todas. No tocante às inovações nenhuma nação manter-se-á estática, o que lhes confere direito às especificidades culturais, geográficas, econômicas, sociais e políticas que definirão sua participação no novo cenário mundial. O hibridismo cultural, os inúmeros elementos concernentes à subjetividade, à formação do homem em suas inúmeras instâncias indicam que cada país deve ser interpretado em princípio como órgão independente com funções próprias e também integrado numa ordem sistêmica que visa o bem estar do conjunto.
Porque por um lado, existem forças que nos coletivizam e aquelas que garantam nossa individuação. A parte da coletivização fica por conta da estrutura biológica dirigente de interesses, necessidades que criam equivalências entre os homens e a cultura pelos seus valores e códigos de sobrevivência. Entretanto, ambas não conseguem privar-nos de nossas especificidades. Universalizar é um caminho, mas está longe de garantir todas as respostas às perguntas que fazemos. Não precisa ir tão longe, observemos os múltiplos modelos de estado em termos de níveis de modernização econômica e o fato de cada um deles refletir nas inovações, instâncias e eventos conforme suas especificidades. Quer dizer, estamos diante de um paradoxo inextirpável: 'é sempre o mesmo homem, mas é também sempre outro homem'. Contudo, existe algo que realmente aproxima todos nós: o desejo de ter uma vida melhor. Tanto que temos uma tradição de esforços e alternativas para alcançar nossas metas, nos apropriando de recursos, estratégias, questões profundas em relação ao tripé ser-tempo-espaço que nos levem ao seu bem estar. Seja individual ou coletivamente, estamos todos fixados em criar o mesmo tecido, pois temos a dimensão do individuo restringido, mas também da sua relação com o conjunto que resguarda sua relação com o outro. Em ambas as esferas (eu-todo) os agentes das inovações devem assumir a responsabilidade de não renegar nenhum dos dois pilares, porque são eles que orientam o equilíbrio interno-externo que deve regular todas as ações humanas.
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